Muita gente sonha com a entrada da BMW na MotoGP e se pergunta por que isso não acontece. Mas houve um tempo em que a marca alemã pensou seriamente no assunto e chegou a testar um protótipo. Reunimos tudo o que conseguimos encontrar sobre o assunto aqui.
Após décadas utilizando motores de dois tempos, o Mundial de Motociclismo decidiu migrar definitivamente para os motores de quatro tempos em 2002. Os motivos eram variados: pressões ambientais, limite no desenvolvimento e tornar a competição mais atrativa para novos fabricantes.
Isso deu parcialmente certo. Ducati e Aprilia realmente ingressaram de imediato, com a Kawasaki vindo na sequencia. E só. A BMW Motorrad, que ainda nem fazia motos esportivas, ficou de pensar no assunto, mas estava concentrada em seus esforços na Fórmula 1.
Após firmar uma parceria com a equipe Williams, a BMW vinha investindo pesado na Fórmula 1 no início dos anos 2000. Seu motor V10 era considerado um dos melhores e mais potentes da categoria. Mas era quase impossível ser campeão na era dominada por Michael Schumacher e a Ferrari.
A parceria entre a Williams e a BMW acabou em 2005. E a diretoria da empresa liderada pelo Dr. Herbert Diess começou a pensar em outras categorias esportivas. A MotoGP era a primeira da lista e foi dado o sinal verde para a construção de um protótipo.
A MotoGP já vivia outro momento de transição nessa época. Os motores, que inicialmente tinham 990 cm³ de capacidade cúbica, seriam reduzidos para 800 cm³ em uma nova tentativa de ganhar apelo com novos fabricantes. Diess teria prometido à Dorna ingressar em 2007.
O protótipo foi construído em Modena pelo ex-engenheiro da Ferrari, Mauro Forghieri, que agora era responsável pela ORAL High-Performance Engineering, um empresa de usinagem e design considerada a mais bem equipada da Itália.
Derivado do motor V10 de Fórmula 1, o propulsor tinha três cilindros em linha, comando de eixo duplo e doze válvulas de titânio. Supostamente pesava apenas 51 kg, bastante leve até para os dias de hoje. Era capaz de girar a 18.000 rpm e desenvolver 210 cv. A eletrônica era fornecida pela Magneti Marelli.
O chassi era do tipo dupla trave de alumínio, com garfos Öhlins invertidos. O sistema de transmissão por corrente era posicionado incomumente no lado direito. A pintura, em branco e azul, lembrava bastante a dos carros de F1 anteriores.
O protótipo foi testado pela primeira vez em fevereiro de 2006 nas instalações da BMW. A marca divulgou um comunicado que o descreveu como um “veículo de teste para estudar processos altamente dinâmicos no gerenciamento do motor e da dinâmica de direção sob condições extremas com o objetivo de produção futura de modelos”. Nada de MotoGP.
Questionada a respeito, a BMW Motorrad sempre desmentiu uma entrada iminente na MotoGP. O gerente de comunicações da marca nos EUA, Roy Oliemuller, disse que não havia planos específicos para correr com a moto. Mas fontes internas confirmaram que era sim um esforço oficial de corrida.
Os testes prosseguiram nos meses seguintes, na Itália e também na Espanha, no circuito de Almeria. Para pilotar o protótipo, eles chamaram o experiente britânico Jeremy McWilliams, que já havia pilotado a problemática Aprilia RS Cube na MotoGP nos anos anteriores.
Outro piloto que experimentou o protótipo foi o italiano Luca Cadalora, campeão nas 125cc e 250cc, além de ter sido piloto de MotoGP até 2000. Os tempos dos testes permanecem um mistério. Logo em seguida, o assunto foi rapidamente abafado. Não mais se falou sobre BMW na MotoGP.
“Este é o motor mais indomável que já pilotei, tínhamos uma equipe eletrônica de cerca de 20 pessoas e esta ECU foi a base usada para seu projeto WorldSBK, quando ficou óbvio que isso nunca iria funcionar“, disse McWilliams em 2018 e lançando alguma luz sobre o que aconteceu nos bastidores.
“A dinâmica de motocicletas potentes que operam nos limites da física estão atualmente entre os fenômenos mais complexos neste campo. Para os nossos engenheiros, isto representa uma tarefa altamente sofisticada e ao mesmo tempo fascinante“, disse o professor Burkhard Göschel, responsável pelo desenvolvimento do projeto, talvez admitindo que eles não tinham know-how suficiente.
Herbert Diess, por sua vez, via estas atividades válidas para o desenvolvimento de um modelo de série: “Sistemas para gerenciar forças dinâmicas longitudinais, como controle de deslizamento, serão introduzidos em motocicletas potentes em série produção nos próximos anos. Além do ABS, farão parte de um conceito integrado que visa aumentar a segurança ativa“, disse profeticamente.
Como sabemos, a BMW não entrou na MotoGP e desde então sequer cogita a hipótese. Porém os estudos não foram em vão. O conceito do chassi empregado no protótipo serviu de base para a primeira geração da S1000RR apresentada em 2010, que se destacava pela alta tecnologia embarcada.
Em vez da MotoGP, a BMW preferiu investir no Mundial de Superbike, onde não precisava construir um protótipo do zero muito mais caro – bastava utilizar a base de sua S1000RR. Mesmo assim, os resultados nessa primeira passagem (entre 2009 e 2015) foram aquém das expectativas.
Decidida a deixar uma impressão melhor, a BMW voltou com tudo para o campeonato em 2019. Mas apesar de contar com pleno apoio da fábrica, ainda nem um pódio foi conquistado. Talvez a última cartada seja dada no próximo ano com a chegada da estrela turca, Toprak Razgatlioglu.