Pilotar uma motocicleta clássica sempre é uma sensação inesquecível. Ainda mais quando se trata de uma Suzuki GSX 1100 S Katana 1982, reconstruída com todo o amor e carinho na garagem desse colecionador inglês.
Lançada como conceito no Salão de Colônia de 1980, a Katana era revolucionária. O nome remete à letal espada utilizada pelos soldados aristocráticos japoneses, mais conhecidos como “samurais”. Longa e afiadíssima, a arma era temida pelos oponentes. A motocicleta deveria causar a mesma impressão.
Para tanto, a Suzuki decidiu inovar e, pela primeira vez em sua história encomendou o desenho a uma empresa terceirizada. O vencedor foi o projeto apresentado por Jan Fellstrom, da alemã Target Design. O conceito era bastante ousado, o primeiro a apresentar uma integração entre o tanque de combustível e o farol carenado.
A versão de produção foi revelada no final de 1981 e não diferenciava muito do conceito. A Katana já chegou abafando, ganhando o título de moto de produção mais veloz feita até então. Também foi um sucesso de vendas e seu design teve um impacto duradouro na indústria motociclística. Partes de seu conceito ainda estão presentes em muitas esportivas atuais.
O mesmo impacto aconteceu entre a molecada da época, que passou a sonhar com uma Katana. Um deles era Niall Gledhill: “Eu a vi um dia quando ainda era criança, mesmo antes de ter motos“, disse o britânico. “Ela não se parecia em nada com o que tinha nas estradas ou o que as pessoas estavam andando naquele momento.”
Como normalmente acontece nesses casos, esse desejo ficou adormecido, até que em um domingo à noite, Gledhill achou uma GSX 1100 S (a versão mais esportiva) a venda no Ebay por apenas mil libras. Já possuindo outras motos, a ideia não foi bem recebida em casa: “você já tem uma, não pode ter outra“, dizia sua mulher. Ele, no entanto conseguiu convencê-la ao dizer que a moto seria para ela.
Gledhill saiu à caça da moto no dia seguinte. A ansiedade era tamanha que o britânico desajeitadamente pegou uma van emprestada na concessionária Hyundai onde trabalhava, mas esqueceu completamente de levar uma rampa ou tiras para amarrar a moto. Conforme o descrito no anúncio, a Katana pegou de primeira e a paixão reacendeu na hora.
Apesar de funcionar bem, faíscas de combustão no arranque denunciavam excesso de combustível nos carburadores, que foram retirados assim que chegou em casa. Após 34 anos, a Katana tinha um aspecto gasto, mas estava em bom estado geral. No entanto, era uma peça nobre demais para deixar assim e Gledhill bolou um plano de rejuvenescimento sem gastar uma fortuna no processo.
Para economizar custos, Gledhill desmontou inteiramente a Katana em casa, catalogando suas partes em níveis de restauração como: peças para serem pintadas, peças para serem retificadas, componentes que necessitavam de atenção especial e outros que deveriam ser comprados novamente.
Braço oscilante, pinças, protetor de corrente, bandeja de bateria, suportes de carenagem, suportes do para-brisa e vários outros pequenos acessórios foram lixados e repintados, a maioria em preto. O quadro em berço duplo recebeu novamente a sua cor prata original. O trabalho caseiro permitiu a Gledhill economizar e ter horas de prazer conhecendo a Katana de dentro para fora.
Outras peças como a caixa de ar, manetes, amortecedores, bengalas e tampa de motor foram cromadas novamente. As rodas de liga-leve foram limpas, assim como as pinças e os pistões dos discos de freio, que já eram vazados para uma melhor refrigeração. Poucos componentes precisaram ser substituídos ou adaptados, como o suporte da alavanca de embreagem, que veio de uma Kawasaki.
Como o motor estava relativamente em ordem, Gledhill optou por não se envolver em uma profunda e cara retificação preferindo trocar apenas retentores e juntas. Além da limpeza nos quatro carburadores Mikuni BS34SS (que estavam completamente sujos de restos de gasolina necessitando ficar de molho por dias), apenas as tampas foram repintadas.
Para finalizar, a pintura foi inspirada em uma Katana australiana que Gledhill viu online. A cor é chamada de azul gelo (Ice Blue), a mesma utilizada no Subaru Impreza WRX STI WR1. A capa do assento foi refeita em vinil ao invés do camurça original. O feliz proprietário afirma que a motocicleta roda que é uma beleza e já viajou por mais de mil quilômetros sem uma única falha.
Ao guidão
Gledhill emprestou a moto aos experientes editores do Motorcycle News. Segundo eles, não parece que estamos pilotando uma moto de 34 anos. A posição de pilotagem, por exemplo, não é muito diferente de uma GSX-R1000 recente ou até mesmo uma Hayabusa. Ou seja, após todo esse tempo, a Katana ainda continua sendo uma legítima esportiva e não é o que podemos chamar de confortável.
O motor, um quatro cilindros em linha de 1074 cm³, com duplo comando, refrigerado a ar tem um ronronar distinto que você só ouve com os escapamentos originais. O comportamento também é único, com excelente torque em baixa sem perder a suavidade. Como em toda Suzuki, o câmbio tem engates precisos e, apesar de possuir apenas cinco marchas, você não sente necessidade de mais, tão bem escalonadas que são.
Apesar dos avanços, a Katana foi construída em uma época onde a preocupação com a ciclística vinha depois da potência, de modo que as curvas pedem moderação. Ela se sai muito bem forçando em até 75%. Além disso, se torna instável e você se depara com os limites das suspensões dos anos 80, seu longo entre-eixos e o alto peso (243 kg em ordem de marcha), que limitam bastante a potência (por volta dos 110 cv a 9.500 rpm).
Mas agora, a Katana não tem mais obrigação de satisfazer consumidores. Mesmo assim, o piloto moderno mantém aquela agradável sensação de estar ao comando de algo muito especial e, também, incomum. São essas máquinas que realmente entram para a história e valem a pena restaurar e colecionar.