O GP da Alemanha realizado no último domingo (21) foi histórico para a Honda pelos motivos errados: foi a primeira corrida sem uma moto da marca na zona de pontuação da Classe Rainha em mais de 40 anos. A última vez havia acontecido em 9 de maio de 1982.
Era época do Grande Prêmio da França realizado no circuito Paul Armagnac, localizado no sudoeste do país. Com cerca de três quilômetros de extensão na época e poucas curvas, Nogaro, como é melhor conhecido, vinha hospedando o Mundial de Motociclismo desde 1978, mas não sem críticas.
Em 1981, todos haviam feito uma reclamação à FIM e aos organizadores sobre as péssimas condições do circuito. O asfalto estava ruim, os boxes não tinham espaço para acomodar a todos (Angel Nieto ficou indignado por ter que estacionar sua van fora do autódromo) e alguns trechos da pista eram perigosos, como evidenciou os fortes acidentes de Randy Mamola e Kenny Roberts em testes poucos dias antes.
Liderados por Franco Uncini, os pilotos encaminharam na sexta-feira anterior à corrida, 7 de maio, um documento formal por escrito onde alegavam que suas reivindicações no ano anterior não haviam sido cumpridas. Em seguida, eles recolheram seus equipamentos e foram embora, sem dar chances aos organizadores de qualquer negociação.
Ao todo, 27 pilotos aderiram ao boicote, divididos entre as classes que então competiam no Mundial, 125cc, 250cc, 350cc e 500cc. Entre eles estavam os principais nomes da Honda, como Freddie Spencer, o campeão reinante Marco Lucchinelli e o japonês Takazumi Katayama, todos com o devido apoio da equipe.
Além disso, o protesto também tirou de cena nomes importantíssimos como Kenny Roberts e Barry Sheene (ambos da Yamaha), Randy Mamola, Loris Reggiani e Franco Uncini, todos da Suzuki e, nas outras classes, Angel Nieto e Ricardo Tormo (125cc), o mesmo que batiza o circuito de Valência atualmente.
Apesar do motim, o evento seguiu adiante com vitórias de Michel Frutschi (500cc) Jean-François Baldé (350cc), Jean-Louis Tournadre (250cc) e Jean-Claude Selini (125cc). Os organizadores, por sua vez, realizam um protesto formal junto à FIM pedindo duras sanções aos pilotos e equipes, o que foi rechaçado.
O Mundial de Motociclismo nunca mais voltou à Nogaro e a partir de 1983 eles iniciaram um revezamento entre Le Mans e Paul Ricard. Nos anos 1990, o circuito de Magny Cours também integrou o calendário, antes deles se estabelecerem em definitivo em La Sarthe a partir de 2000.
Mas em 1982, a Honda vivia uma situação muito diferente de 2022: com o genial Freddie Spencer ainda a caminho de ser tornar campeão pela primeira vez, a fabricante japonesa havia encostado definitivamente a problemática NR 500 de quatro tempos (aquela dos pistões ovais) em prol de uma nova moto: a NSR 500 de dois tempos.
Com a nova máquina, Spencer venceria pela primeira vez no GP da Bélgica, em 4 de julho de 1982. O norte-americano seria campeão no ano seguinte e novamente em 1985, nas 500cc e 250ccc… ao mesmo tempo! E a Honda NSR 500 se tornariam uma das motos mais bem sucedidas da história do motociclismo.
Quarenta anos, 14.637 dias corridos e 633 corridas depois, a Honda está tecnicamente no fundo do poço: três de seus quatro pilotos abandonaram o GP da Alemanha, um por acidente, dois por problemas mecânicos. Apenas Stefan Bradl cruzou a linha de chegada, em 16º e último, a longínquos 52 segundos do vencedor Fabio Quartararo (Yamaha).
Todos os pilotos são unânimes em dizer: a Honda RC213V é simplesmente uma motocicleta difícil demais de pilotar. E sem Marc Márquez para cobrir suas falhas, a verdade nua e crua apareceu: a marca vem em último no Campeonato de Construtores com 81 pontos, 12 atrás da Suzuki, que também não marcou nada em Sachsenring.