Hoje em dia, o motociclismo de manobras radicais está novamente na moda. Mas, muito antes de Travis Pastrana havia alguém que fazia tudo isso com muito menos segurança. Conheça Evel Knievel, o homem que praticamente inventou o Stunt.

Nascido como Robert Craig Knievel no dia 17 de outubro de 1938 em Butte, em Montana, Evel desde criança mostrou gosto pelo perigo e por aventuras, ganhando esse apelido depois de ter sido preso em 1956. Ele bateu sua motocicleta enquanto fugia da polícia e acabou sendo detido por direção perigosa.
Durante a noite, o guarda responsável na delegacia percebeu que Knievel estava em uma cela ao lado de William Knofel, um perigoso bandido apelidado de “Awful” Knofel (terrível Knofel). Brincando, o policial passou a chamar Knievel de “Evil” para rimar com a situação.
Knievel adorou como a palavra soava bem com seu sobrenome e acabou adotando o apelido, modificando-o, mais tarde, para “Evel”, para não correr o risco de ser associado com algo do mal. Começava aí o talento para controlar a própria imagem, uma noção que aprimoraria constantemente ao longo de sua vida.

Depois de terminar o ensino médio, Knievel arranjou um emprego de minerador na empresa Anaconda Mining Company. Lá, acabaria sendo promovido a operador de retro escavadeira, mas não por muito tempo: foi demitido por empiná-la como se fosse uma moto por cima das linhas elétricas! O incidente acabou deixando a cidade sem eletricidade por várias horas.
Knievel, no entanto, não dava bola para empregos regulares, algo que considerava “coisas sem importância”. O seu passatempo preferido era andar de motocicleta, de preferência de modo arriscado.
Também participou de rodeios, saltos de esqui (chegando inclusive a ser campeão em 1959), saltos com vara (integrando a seleção de atletismo do país) e do time de hóquei da cidade, os Butte Bombers.
A sua passagem pelos Bombers foi apoteótica. Knievel conseguiu convencer a seleção da Checoslováquia a jogar um amistoso com eles, em preparação para as olimpíadas. Evel, no entanto foi expulso do jogo e deixou o estádio. Quando os checos foram receber as receitas do jogo, descobriram que elas tinham sido roubadas! O Comitê Olímpico dos Estados Unidos precisou pagar a conta para evitar um incidente de proporções internacionais.
Por essa altura, Knievel já estava casado com sua primeira esposa, Linda Joan Bork e já tinha seus dois primeiros filhos, Kelly e Robbie. Ele percebeu, então que precisava de dinheiro para sustentar a família e se meteu em diversos tipos de empreitadas: de caçador a vendedor de seguros e dono de concessionária.
Knievel também passou a competir regularmente no circuito de motocross norte-americano, mas o ponto da virada aconteceu quando começou trabalhar para Don Pomeroy em sua loja de motocicletas em Sunnyside, Washington. Lá, Jim Pomeroy, um conhecido piloto ensinou à Knievel diversas técnicas de pilotagem.
O nascimento dos “Diredevils”
Ainda tentando achar um jeito de ganhar dinheiro legalmente, Knievel lembrou-se do show promovido por Joie Chitwood, que era um dos pilotos mais conhecidos da época. Entre as corridas, Chitwood também fazia espetáculos, como saltar por cima de carros e outras bizarrices. Knievel pensou em fazer o mesmo, só que com motos.
Knievel pegou sua Honda 250cc e fez uma experiência, entretendo uma pequena multidão com empinadas e algumas manobras radicais. A boa recepção do público motivou-o a bolar o seu próprio show fazendo tudo sozinho, desde providenciar o local, escrever os comunicados de imprensa, configurar o espetáculo, vender os ingressos e ser seu próprio mestre de cerimônias!
Os primeiros shows de Knievel consistiam em saltar vinte pés de comprimento sobre caixas de cascavéis e dois leões. Com o sucesso, logo ficou evidente que precisava contratar mais artistas, coordenadores e outros funcionários para se concentrar nos saltos. Também precisava de uma moto melhor e passou à utilizar uma Norton 750 e depois uma Triumph Bonneville T120.
A estreia de “Knievel e os diredevils” aconteceu em 3 de janeiro de 1966, no Festival Data Nacional, em Indio, Califórnia, sendo um estrondoso sucesso. Para ficar sempre um passo à frente da concorrência, que estava imitando seu show e saltando sobre animais ou piscinas de água, Knievel começou a pular sobre carros, cada vez em maior número.

Em Missoula, Montana, ele tentou voar sobre doze carros e uma van de carga. Sem conseguir velocidade suficiente, sua roda traseira bateu no teto da van enquanto sua roda dianteira bateu no topo da rampa de pouso. Knievel acabou com um braço e várias costelas quebradas. O acidente e a posterior estadia no hospital renderam uma inesperada publicidade.
Knievel, no entanto, parecia não ter medo de se machucar. Logo após a recuperação, estava novamente tentando novas e ainda mais ousadas manobras. O público respondia sempre com entusiasmo, querendo que mais e mais carros fossem acrescentados ao show.
Em julho de 1967, Knievel tentou saltar por cima de 16 carros em Gardena, na Califórnia. Os resultados, no entanto foram desastrosos, acarretando em uma concussão grave. Um mês depois, ele voltou ao mesmo local para completar o show… e caiu novamente! Dessa vez, quebrou o pulso esquerdo, joelho direito e duas costelas.
A expectativa que deixava o público sem saber se os saltos seriam bem sucedidos ou não aumentavam cada vez mais a popularidade de Knievel. A fama nacional foi consolidada quando foi chamado pelo ator Joey Bishop à participar de seu talk show. A exposição trouxe tanto um salário maior quanto uma enorme massa de fãs.
Enquanto visitava Las Vegas, Knivel viu pela primeira vez as fontes do hotel Caesar’s Palace e vislumbrou ali o seu mais perigoso e glorioso salto. Para impressionar Jay Sarno, chefe do cassino, Knievel falou até o que não sabia, inventando uma empresa fictícia (a Evel Knievel Enterprises) e advogados que não existiam para persuadi-lo a realizar o show. Knievel também fez o mesmo com a rede de televisão ABC, tentando vender os direitos de imagem, sem sucesso.
Com Sarno, no entanto, as patacoadas deram resultado e o desafio foi agendado para 31 de dezembro de 1967. Contudo, o grande momento foi marcado por um enorme acidente: devido à uma súbita perda de potência em sua Triumph, Knievel aterrissou mal e perdeu o controle, estatelando-se no chão bem em frente às câmeras e à gigantesca multidão que compareceu para vê-lo.
Mais de 40 ossos foram quebrados e outra concussão o manteve no hospital por alguns dias. Knievel, no entanto, fez questão de aumentar o sensacionalismo só para fins publicitários: à imprensa, disse que tinha ficado em coma por 29 dias. Depois de sua queda e recuperação, Knievel era mais famoso do que nunca. A rede ABC comprou os direitos do filme do salto, pagando muito mais do que originalmente previsto.
Fama e confusões durante os anos 1970
Dono de uma personalidade irrequieta, Knievel era do tipo de cara capaz de tudo para atingir seus objetivos. Isso rendeu-lhe uma legião de fãs, mas também alguns inimigos. No começo dos anos 1970, no auge de sua popularidade, o piloto chegou a ser investigado pelo FBI.
Segundo os agentes federais, Knievel estava envolvido em uma série de espancamentos. O FBI esteve próximo de indiciar o piloto, que por sua vez ameaçou processá-los de volta, alegando que a organização estaria ligada a um sindicato do crime. Tudo acabou sendo arquivado.
Agora com dinheiro e fama, Knievel refinou seu show. Sua nova parceira de saltos era uma Harley-Davidson XR 750, que acabou se tornando sua moto mais conhecida. Sua vestimenta também ficou mais elaborada. Usando uma capa e trajes de couro espalhafatosos, Knievel era a personificação do herói norte-americano.
Após sua malsucedida tentativa no Caesar’s Palace, Knievel já estava pensando em algo ainda mais ousado. O piloto também havia se tornado hábil em atrair atenção para si e chamou a imprensa para avisar que sua mais nova empreitada seria pular sobre o Grand Canyon! No entanto, ele nunca conseguiria autorização para fazê-lo, assim em 1971 voltou suas atenções para o Snake River Canyon no sul do estado de Idaho.
Um mega salto à foguete sobre o Snake River Canyon
O vale, com 150 metros de largura e 400 de profundidade fez com que Knievel criasse um veículo especial para o desafio. Seria uma espécie de avião à jato, mas ao invés de asas, duas rodas. Após vários anos de testes e aperfeiçoamentos dignos de astronauta, nasceu o X-2 Skycycle, desenhado pelo engenheiro Robert Truax (da NASA!). A tentativa aconteceu em 8 de setembro de 1974.
Apesar da potência ser suficiente, o paraquedas abriu cedo demais, fazendo o Skycycle despencar como uma pedra bem no meio do Canyon em direção ao rio. Preso no interior do veículo, Knivel não conseguiria sobreviver se caísse na água, mas por sorte, os ventos contrários o empurraram para a margem, e ele escapou apenas com um nariz quebrado.
Após a malsucedida tentativa de cruzar o Snake River Canyon, Knievel voltou a se concentrar em saltos mais convencionais, mas não menos midiáticos. Os londrinos até hoje não se esquecem de sua passagem por um lotado estádio de Wembley, em 26 de maio de 1975. Dessa vez, Knievel deveria acelerar sua Harley-Davidson por cima de 13 ônibus single deck, típicos da capital inglesa.
Depois de mais uma vez se arrebentar no chão, Knievel, que estava consciente pediu licença aos médicos para tomar o microfone: “Nesse país maravilhoso estou anunciando minha aposentadoria. Vocês foram os últimos à me ver pular. Mas, entrei andando e vou sair andando”, disse logo após o acidente, deixando o estádio apoiado nos ombros de dois membros da equipe.
Knievel não demorou a mudar de ideia, no entanto. Meses depois saltou com sucesso por 14 ônibus na Kings Island, em Ohio. O salto marcou um dos maiores índices de audiência do programa “Wide World of Sports” da ABC.
Em 1976, inspirado pelo filme Tubarão, o maior sucesso de bilheteria da época, Knievel planejava incorporar os bichanos ao seu show saltando por um tanque cheio de tubarões vivos em um evento em Chicago, que seria transmitido ao vivo pela televisão. Mas, durante um ensaio, Knievel perdeu o controle da moto e colidiu contra um cinegrafista.
Embora tenha quebrado os dois braços, Knievel ficou mais perturbado com o que aconteceu ao cinegrafista, que acabou perdendo um olho em decorrência do acidente. As filmagens foram tão traumáticas que ele se recusou a mostrá-las durante 19 anos, até o documentário “Absolute Evel: The Evel Knievel Story”.

Esse acidente e outros acontecimentos a partir de 1977 fizeram Knievel realmente pensar em aposentadoria. Naquele mesmo ano, por exemplo, a Harley-Davidson cortou o patrocínio oficial, encerrando uma era. O piloto, então voltou a utilizar a velha Triumph Bonneville dos primeiros tempos. Contudo, mais problemas estavam por vir.
Mais tarde naquele ano, Knievel foi viajou até Hollywood única e exclusivamente para dar uma surra em Sheldon Saltman, produtor de filmes e confesso vigarista. Os dois já haviam trabalhado juntos algumas vezes, com Saltman promovendo o famoso salto sobre o Snake River Canyon.
Knievel e um comparsa (possivelmente seu guarda-costas e amigo, Boots Curtis) localizaram o produtor em um estúdio da 20º Century Fox, em Los Angeles e o piloto quebrou-lhe os dois braços com um taco de baseball. O motivo foi uma biografia não autorizada escrita por Saltman, retratando-o como um alcoólatra, um viciado em comprimidos, um antissemita e uma pessoa imoral. “Agora ele não vai mais escrever nenhum maldito livro”, disse Knievel mais tarde.
Nem tudo era ruim, no entanto. Knievel aparecia regularmente em filmes e na televisão norte-americana. Em 5 de novembro de 1977 foi ao ar uma hilária participação sua na série “A mulher Biônica”. No episódio, o piloto (representando a si próprio) ajudava Jamie Sommers (Lindsay Wagner) à escapar de espiões da Alemanha Oriental, com ambos se envolvendo em várias confusões.
Ao mesmo tempo, seu marketing pessoal estava mais forte do que nunca. Desde o início da década, Knievel possuía uma linha completa de brinquedos, fabricados pela Ideal Toys. A marca revelou que chegou a lucrar cerca de US$ 125 milhões de dólares com a imagem do piloto.
Até uma máquina de pimball com a sua decoração foi criada e hoje é creditada como o primeiro jogo totalmente eletrônico da história. A versão eletromecânica é extremamente rara, com apenas 155 unidades fabricadas e os colecionadores a disputam a tapas.
O nascimento de mais dois filhos (as meninas Tracey e Alicia) fizeram Knievel recuar, se concentrando em apresentações menores e ajudando na formação de seu filho Robbie, que resolveu ser um acrobata como o pai. Sua última performance (sem saltar) aconteceu em 1980, em Porto Rico. Já sua última aparição com Robbie foi em março de 1981, em Hollywood.
Vida após a aposentadoria

Durante os anos 1980, Knievel voltou à obscuridade do passado, se metendo em todo o tipo de negócio, chegando a viajar pelos Estados Unidos vendendo de obras de arte supostamente pintadas por ele. Mas, nos anos 1990, seu nome ganhou status cult, pela nova geração, passando a representar oficialmente o cassino londrino Maxim, a rede de pizzas Little Caesars, a Harley-Davidson entre outras empresas.
Depois de 38 anos, o casamento com Linda Joan Bork ruiu no começo de 1990. Mas, em 1992, Knievel começou a namorar Krystal Kennedy, com quem se casou pela segunda vez, em 1999. A cerimônia aconteceu em uma plataforma especialmente construída sobre… as famosas fontes do Caesar’s Palace que tentara pular 32 anos antes!
Apesar de terem se separado em 2001, o casal permaneceu próximo até a morte de Knievel, em 30 de novembro de 2007, aos 69 anos devido à uma fibrose pulmonar idiopática. Em uma de suas últimas entrevistas, concedida à Maxim Magazine, Evel explicou melhor sua vida.
“Você não pode perguntar à um cara como eu o motivo de fazer aquelas coisas. Eu realmente queria voar pelo ar. Eu era um diredevil, um performer. Eu amava a emoção, o dinheiro, toda aquela ‘coisa de macho’. Tudo isso me fez ser Evel Knievel. Claro que eu tive medo. Você Tem que ser um idiota para não sentir medo. Mas eu superei a morte.”
Abrindo portas para a nova geração
Hoje, Knievel é considerado um gladiador à moda antiga. O termo foi associado ao piloto pela primeira vez em 1971, em um filme sobre ele estrelado por George Hamilton e faz referência aos gladiadores romanos, que arriscavam a vida em grandes arenas. Também pode ser considerado o pai do stunt moderno, muito melhor pensado e menos arriscado.
Aliás, filmes sobre Knievel é o que não faltam. Uma produção de 1988 também possui o nome de “The Last Gladiator”, além do já citado “Absolute Evel: The Evel Knievel Story”. O mais novo chama-se “I Am Evel Knievel” e estreou na TV britânica em maio, justamente quando completou-se 40 anos de seu salto em Wembley. Seu legado é mantido pelos filhos Robbie (que ainda é um acrobata) e por Kelly que administra tudo relacionado ao nome do pai.
Mas, se Knievel foi o último gladiador, também foi o precursor da nova onda de acrobatas extremos das duas rodas. Hoje, o motociclismo freestyle cresce a cada dia e existem até campeonatos como o X-Fighters, bancados por grandes corporações como Red Bull e Monster. Isso só se tornou possível graças ao atrevimento e pioneirismo de Evel Knievel.