Michio Arai, que tem sido presidente e CEO da Arai por mais de quarenta anos relembrou a trajetória do pai, Hirotake que fundou o que hoje é a maior empresa de capacetes do mundo.
Boa parte dos componentes motociclísticos que você utiliza no dia-a-dia foram criados no Japão. O capacete é um deles. A Arai foi fundada em 1926 por Hirotake Arai, um homem que antes da segunda guerra mundial fabricava… chapéus!
O site da Moto America, a categoria norte-americana de superbikes publicou recentemente uma entrevista com o filho de Hirotake, Michio, que assumiu o comando da empresa durante os anos 1970 e continua à sua frente até os dias atuais.
Michio, mesmo sendo já um septuagenário faz questão de experimentar todos os produtos da Arai Helmets e contou como seu pai – que também era um motociclista – começou a empresa do nada, inventando a base do capacete moderno. Confira.
Meu pai não frequentou a faculdade. Na verdade, ele nem terminou o ensino médio. Ele era o filho de um fabricante de chapéus em Tóquio, e seu hobby era o motociclismo. Ele costumava andar em uma motocicleta sem capacete, usando apenas um chapéu de palha. Naqueles dias, não haviam capacetes para motociclistas.
Meu pai costumava dizer: “Eu sou um bom piloto.” Eu não acho que ele era, mas ele gostava de andar de moto. Eu gosto de motocicletas também. Eu realmente gosto de motocicletas.
Durante a Segunda Guerra Mundial, os soldados japoneses foram enviados para o Sudeste Asiático, e o clima era realmente quente. Eles precisavam de algum isolamento para o calor, mas ao mesmo tempo tinha que ter ventilação. Meu pai veio com algo novo. Ele cortou alguns bambus, fez uma gaiola e colocou algo como uma toalhinha. O exército gostou, o que foi bom para ele já que não foi recrutado.
Depois da guerra, ele tentou criar outras empresas. Ele gostava de inventar coisas, e não apenas comprar e vender. O primeiro capacete que você pode imaginar foi feito para trabalhadores de mineração. Eles precisavam de proteção. Naqueles dias, até mesmo o capacete de construção era novo. Ele teve que fazer tudo do zero.
Meu pai poderia ter sobrevivido bem apenas fazendo capacetes para mineradores. Mas, em vez disso, ele decidiu fazer capacetes de motocicleta para um mercado que não existia. Ele modificou um escudo que tinha feito para as construções.
Isso foi no final de 1940. Eu estava na escola primária. Eu o vi fazer os capacetes. Me lembro que o primeiro escudo foi feito com lona e resina, aqui mesmo nesse lugar. O prédio é diferente mas a localização é a mesma.
O primeiro ramo foram as corridas de apostas. É pista de terra, como apostar em cavalos. Naturalmente, eles sofriam um monte de acidentes e lesões. Eles se aproximaram de meu pai, e ele disse que iria fornecer capacetes à eles. Ele fez o primeiro capacete de motocicleta comercial no Japão.
Meu pai não entendia muito de química, mas ele leu um artigo sobre fibra de vidro e disse: “Isso pode ser bom.” Eu ainda não sei o que ele fez, mas ele foi até algum professor universitário e descobriu como fazer uma meia concha de fibra de vidro. Esse foi o primeiro casco de fibra de vidro neste país.
Ele forrou o primeiro capacete com cortiça. Essa foi a primeira coisa que ele pensou que poderia usar. Ele leu um artigo sobre isopor e, de alguma forma fez um forro de isopor. Não havia mofo, então ele fabricou um molde e colocou o forro em uma casca de fibra de vidro. Ele, sem dúvidas estabeleceu a base para o capacete de motocicletas moderno.
Houve outra empresa de capacetes pioneira, a Bell. Roy Richter foi o proprietário. Eu o conheci muito bem. Meu pai começou do outro lado do mundo, por isso, não sei quem foi o primeiro, mas ele não copiou ninguém.
Antes de meu pai, não havia um mercado para capacetes neste país. Ele começou uma indústria que tem ficado cada vez maior ao longo dos anos.
Eu nasci com capacetes e corri com capacetes. Então, um capacete é como se fosse uma parte do meu corpo.
Para criar um capacete melhor, você precisa fazer testes. Não havia nenhum dispositivo para testar, então meu pai fez um capacete velho com o formato de uma cabeça dentro e uma corda. Isso era muito primitivo, mas pelo menos você poderia dizer qual era melhor. Quando nosso governo começou a pensar em escrever uma legislação a respeito, eles naturalmente procuraram meu pai.
Meu pai fez um “ninho de pássaro” em forma de fibra de vidro. Ele colocou o ninho em um molde, acrescentou resina, aplicou calor e pressurizou com uma bolsa de ar para fazer uma concha. Essa foi a forma como o meu pai começou, e ainda fazemos dessa maneira.
Eu decidi que se pudéssemos fazer uma concha com rigoroso controle de pressão teríamos uma vantagem. Eu tentei estabelecer um sistema infalível, mas não houve tal maneira. A resposta final foi cuidar muito bem de cada concha.
Meu pai nunca pensou em usar corridas para promoção. Ele nem sequer pensava em promover a marca. Mas, como a indústria começou a crescer, ele pensou que talvez pudéssemos fazer algo a respeito.
Eu corria como carros-esporte como um piloto semi-profissional. Eu era um bom piloto e eu ainda sou, mas eu sabia que nunca seria o número um. Então, um dia eu decidi que este seria o meu negócio.
A diferença entre meu pai e eu era que eu gosto de correr. Eu queria competir. Meu pai gostava de andar de moto, apenas. Ele gostava da vida. Se ele estivesse feliz e saudável, ele estava bem. Já eu gosto de ganhar. A Arai estava perdendo. Eu disse ao meu pai: “Aqueles caras estão ficando maiores. Precisamos fazer alguma coisa. “Ele disse:” Ok, você assume.” Isso foi 1975.
Um dia, uma jornalista de uma revista de motocicletas veio até mim. Ela perguntou: “O que você vai fazer?” Ela estava usando um Bell. Eu disse: “Eu estou buscando a Bell.”
Pilotos tem mais probabilidades de usar a proteção, então eu pensei que o envolvimento com corridas poderia ser o caminho. Dominar este país não demorou muito. Em menos de um ano, eu controlava todo o Japão. Começamos a obter reconhecimento. Então, era hora de ir para o exterior.
Ted Boody Jr. foi o primeiro piloto americano a usar um capacete Arai. Ele tinha 18 anos quando o conheci. Ele disse: “Ei, isso se encaixa bem!” Nós assinamos um contrato e ele ganhou a primeira corrida usando nosso capacete. Isso foi no Houston Astrodome. Por isso continuamos a usar o nome “Astro”.
Eu acredito na natureza. Para mim, a natureza é um exemplo. Eu sempre quero fazer um capacete que seja suave… como um ovo. Então, quando eu desenho uma concha que não segue o contorno básico da minha cabeça, eu não me sinto confortável. Eu acho que isso é o certo.
Nós não projetamos capacetes para ter a forma de um ovo, mas nós queríamos torná-lo o mais confortável possível, para que o piloto senta-se melhor, por proteção. O que desenvolvemos foi uma forma que parece a mesma de um ovo. A Natureza levou à solução.
Ter um negócio é ter competição. Se você não ganhar, você deve sair do negócio. Para permanecer, você tem que lucrar. É claro que eu quero ganhar mais dinheiro, entretanto mais importante é saber se eu posso ganhar a batalha da proteção.
Nós fazemos os nossos capacetes para cumprir as normas e manter o formato básico. Isso é algo que ninguém mais faz. Para manter a capacidade de “olhar adiante,” mantemos um rigoroso controle das características da laminação de região em região.
Manter a forma de concha de fibra de vidro, enquanto você conhece novas normas e regulamentos é realmente difícil porque os requisitos podem variar de uma região para outra. Para manter a forma básica que faz você se sentir “confortável”, você tem que mudar as características do forro de região para região.
Nós queremos fazer o melhor que pudermos em cada escudo. Esse é o objetivo número um. Nós não fazemos escudos especiais. Desde o início, a única coisa que podíamos fazer era o melhor em tudo que fazemos.
Se um novo modelo precisa abdicar da proteção que já desenvolvemos, não há inovação. Acumular pequenas diferenças, pouco a pouco é a base da história da Arai.
A nossa ambição é criar boa proteção ao motociclista. Isto é de base para Arai. Temos que fazer um bom capacete.