No GP da Holanda de 2002, o talento de Alex Barros ficou evidente para todo o mundo. Pilotando uma velha Honda NSR500 dois tempos, o brasileiro liderou praticamente toda a corrida tendo em seu encalço Valentino Rossi.
Barros disputava aquela que é considerada hoje a sua melhor temporada no Campeonato Mundial, que pela primeira vez era chamado de MotoGP. Até então, a Categoria Rainha do motociclismo era conhecida apenas como 500cc, devido ao deslocamento máximo permitido para os motores dois tempos.
Em 2002, no entanto, o regulamento havia mudado. A FIM finalmente permitiu que as fabricantes alinhassem no grid máquinas de quatro tempos e 990 cm³ de cilindrada, um terreno muito mais fértil para inovações do que as dois tempos, que haviam chegado ao limite do desenvolvimento.
A Honda, que sempre acreditou mais nas quatro tempos, trouxe à MotoGP a fenomenal RC211V, indiscutivelmente o melhor protótipo dessa nova era, com um motor de cinco cilindros em V. Yamaha, Suzuki, Ducati, Kawasaki e Aprilia, por outro lado, estavam apenas começando seus projetos.
E não eram todas as equipes Honda que teriam a RC211V logo de cara. De início, apenas o time oficial utilizaria as máquinas. Enquanto isso, as satélites Gresini (de Daijiro Kato) e a Pons (de Barros e Loris Capirossi) ainda teriam a NSR500, menos potente e sofisticada.
Campeã com Valentino Rossi em 2001, a NSR500 ainda oferecia muita competitividade. Graças ao seu menor peso e ao caráter explosivo dos motores dois tempos, os pilotos conseguiam acompanhar as quatro tempos ainda meio desengonçadas em certas situações, como circuitos de baixa velocidade.
Isso, contudo, não impediu Valentino Rossi de vencer cinco das seis primeiras corridas do ano. Na época, o italiano era “apenas” o campeão de 2001, mas com tanta disparidade técnica, caminhava a passos larguíssimos para um fácil bicampeonato.
Com o tempo de 2min01s691, o italiano pegou a pole em Assen a frente de seu grande rival na época, Max Biaggi, Kenny Roberts Jr. e Loris Capirossi. Três décimos atrás, Barros abria a segunda fila, a frente de Carlos Checa, Tesuya Harada e Tohru Ukawa, o companheiro de Rossi na Repsol-Honda.
Na largada, Rossi partiu mal e caiu para quarto, atrás de Roberts Jr, Biaggi e Ukawa. O japonês não demorou a ceder sua posição, de modo que o italiano rapidamente estava disputando a ponta com os dois primeiros. Enquanto isso, Barros e Capirossi vinham apenas em sexto e sétimo, respectivamente.
Barros, no entanto, estava inspirado. O brasileiro ultrapassou Ukawa e logo em seguida superou Biaggi e Rossi praticamente de uma vez só no miolo do circuito. Na volta seguinte foi a vez do líder Roberts Jr. ceder a sua posição ao brasileiro, que assumia a ponta pela primeira vez.
Capirossi, que permanecera em sétimo tentou fazer o mesmo que Barros para ascender às primeiras posições, mas só o que conseguiu foi cair e ficar de fora da corrida. Enquanto isso, o campeão de 2000, Roberts Jr. perdia rendimento deixando Barros e Rossi mais afastados à frente.
Depois da driblada nas primeiras voltas, Rossi passou a observar melhor as linhas de Barros, que surpreendentemente se mantinha à frente. Na reta, porém, a RC211V era assustadoramente mais rápida, parecendo ser de outra classe (o que não deixava de ser).
Os dois abriram uma grande vantagem para Checa, Biaggi e Ukawa, que seguiam juntos na disputa pela terceira posição, sete segundos atrás. Roberts Jr. já tinha quinze segundos de desvantagem em sexto e o resto do pelotão, tomado por motos de dois tempos, sequer aparecia evidenciando o quão impressionante era a pilotagem de Barros.
Rossi só conseguiu tomar a ponta quando restavam apenas quatro voltas para o final. Barros permaneceu próximo, cruzando a linha de chegada apenas 2s2 atrás do italiano. Longe dois dois, Checa completou o pódio. Como uma demonstração de relevância histórica, essa corrida é disponibilizada na íntegra no YouTube com o nome “MotoGP Classics – Assen 2002” e você pode assisti-la aqui.
Mais tarde, Rossi admitiu que tinha reserva técnica para superar Barros, mas confessou ter ficado impressionado com suas trajetórias, principalmente na seção mista do circuito. Os dois pilotos sempre mantiveram, desde então, uma atitude de respeito mútuo e quando vem ao Brasil, o italiano sempre pergunta pelo brasileiro.
Barros continuou disputando as primeiras posições ao longo de 2002 e seu desempenho motivou a Honda a apressar a construção de uma RC211V para que pudesse disputar as últimas etapas do ano em igualdade de condições. Começava o chamado “mundialito” pelo próprio Rossi, já com o bicampeonato garantido. A esperada vitória veio no GP do Japão em Motegi.
O desempenho de Barros em 2002 cimentou a sua reputação como um dos melhores pilotos a passarem pela Categoria Rainha – apesar de não ter conquistado nenhum título. Ele teria a sua chance na Repsol Honda em 2004, mas a situação já era outra. Rossi agora estava na Yamaha e a M1 era, pela primeira vez, uma máquina competitiva. Mas essa é uma história para outra oportunidade.
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